”Para nós, cristãos, era melhor com Saddam”

“A média das famílias cristãs que vem me pedir o certificado de batismo quase chega a sete por dia. Antes do ataque contra a catedral siro-católica do dia 31 de outubro, eram talvez três ou quatro por mês. É o sinal da fuga que cresce. O certificado de batismo serve para obter o visto nas embaixadas ocidentais”.

O arcebispo latino de Bagdá, Jean Sleiman, fala ao telefone da sua residência nos arredores da igreja católica. Com os seus colaboradores, ainda está buscando entender as consequências dos últimos atentados. “Não sei com precisão quantas são as vítimas. Dizem-me que, entre os mortos, há alguns policiais de guarda das zonas cristãs”, observa.

Maronita, nascido no Líbano em 1946, carmelita, professor universitário em Paris, autor há três anos de um livro cujo título parece ser tragicamente premonitório, “Na armadilha iraquiana”, Sleiman também é um intelectual lúcido, atento observador da tragédia que investe contra o país da guerra de 2003.

A reportagem é de Lorenzo Cremonesi, publicada no jornal Corriere della Sera, 11-11-2010. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis a entrevista.

Muitos cristãos defendem que estavam infinitamente melhor nos tempos de Saddam Hussein.

Em geral, diria que a melhor garantia para a segurança e liberdade é o Estado de direito. Mas ele certamente não existe hoje. A tirania baathista defendia os cristãos na medida em que exigia a máxima segurança na ordem militar. A ditadura é a morte da alma. Mas, sem dúvida, nos tempos de Saddam, os cristãos estavam protegidos. Para o regime, a segurança era uma coisa sagrada, intocável. Hoje, tudo isso não existe.

Como o senhor compara essa nova onda de atentados anticristãos àquela contra as igrejas no verão de 2004?

É o crescendo da desestabilização. Querem induzir os cristãos a escapar. Visam a difundir o medo. É um salto de qualidade. Antes, atacavam as basílicas, agora também as residências privadas. Defendê-las é difícil. Nos últimos dias, foram colocados guardas armados na frente das instituições cristãs. Mas deveriam aumentar as patrulhas da polícia também nas zonas habitadas dos cristãs. Sei que é complexo. Muitos vivem em bairros mistos.

Por que justamente agora?

Não excluiria uma conexão com a prorrogação das negociações para a formação do governo. Quer-se fazer pressão em contrapartida.

Quem? Os extremistas sunitas no fronte xiita de Maliki?

Possivelmente. Mas também é possível o oposto. Por exemplo, os extremistas xiitas contra a inclusão dos sunitas.

O senhor vê algum papel do Irã?

Não o excluo, de fato. A situação é complexa. O país está profundamente desestabilizado. As bombas contra os cristãos são um modo para aumentar o preço. A violência paga, e nós é que acertamos as contas.

O senhor se sente ameaçado?

Assim como todos os cristãos. Nesta manhã, também me disseram para não sair de casa. Nos últimos dias, além de todas as bombas, pelo menos dois cristãos foram assassinados na capital em circunstâncias ainda a serem esclarecidas. Mas, na nossa comunidade, também há quem está se organizando para a defesa. Muitos gostariam de partir. Alguns, porém, pensam que a nossa tradição de 2 mil anos deve ser garantida de todas as formas.

Fonte: IHU Online

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